Central do associado

Central do associado Entrar
Esqueci minha senha

Daniel Cardoso, vice-presidente da Aproesc

O conceito de obsolescência programada se prende, em uma explicação bastante simplória, à definição antecipada do momento em que determinado produto deixará de servir. Os casos mais notórios dizem respeito à introdução artificial de “defeitos” em determinadas mercadorias, de modo a evitar que o objeto dure para sempre, e a obrigar o consumidor a, periodicamente, adquirir novo produto em substituição ao que deixou de funcionar. Mas o que a obsolescência programada tem a ver com a coisa julgada? Do ponto de vista jurídico, pode-se afirmar que rigorosamente nada.

A coisa julgada, ao lado do direito adquirido e do ato jurídico perfeito, é um dos pilares sobre os quais se funda o dogma da segurança jurídica, valor essencial à sociedade, representativo da garantia de que os conflitos precisam, eventualmente, ter um fim. Por isso mesmo, a coisa julgada não pode admitir a introdução artificial de defeitos, pouco importando o nome ou a sofisticada teoria jurídica que se invoque para tanto. Diante disso, manifestações com tendência a relativizar a coisa julgada que reveste a questão da isonomia vencimental entre Procuradores dos Poderes do Estado devem ser recebidas com preocupação, não apenas pelas partes do processo, mas também por toda a sociedade.

Caso admitida a tese da “alteração do quadro fático-normativo”, já afastada pelo próprio Tribunal de Justiça de Santa Catarina em outra oportunidade, inclusive, estaremos diante de figura jurídica totalmente nova, a da “coisa julgada a termo”, ou a da “coisa julgada com prazo de validade”. Mesmo os defensores da controvertida tese precisam reconhecer que a teoria não pode ser invocada para renovar discussões que já se encontram superadas, sob pena de eternização do litígio.

A pretendida inovação, para além dos efeitos entre as partes do processo, criará precedente temerário, de possibilidade de rediscussão de argumentos já vencidos, a depender do lapso de tempo entre o julgamento e a renovação da lesão ao direito. Ou será que, assim como ocorre com as lâmpadas incandescentes, não é conveniente que a coisa julgada dure para sempre?

*Artigo publicado no Jornal Notícias do Dia em 12 de outubro de 2020